03/06/2025

Justiça suspende cobrança milionária de CSLL

Por: Luiza Calegari
Fonte: Valor Econômico
Uma empresa de laminação de alumínio obteve liminar na Justiça para
suspender a cobrança de R$ 11 milhões de CSLL. O valor passou a ser
exigido após a Receita Federal negar o abatimento de multa e juros sobre o
débito tributário principal, conforme permitido pela Lei nº 14.689, de 2023,
quando o contribuinte é derrotado no Conselho Administrativo de Recursos
Fiscais (Carf) por voto de qualidade.
A Receita entendeu que essa lei não valeria para casos de compensação
tributária. A decisão é um dos primeiros precedentes a respeito do assunto,
segundo tributaristas, e pode servir de paradigma para outros contribuintes que
estejam na mesma situação.
No caso, a empresa tinha feito uma declaração de compensação para pagar a
CSLL devida com outros créditos tributários. No entanto, a Receita não aceitou
os termos da compensação declarados pelo contribuinte.
A companhia recorreu na esfera administrativa e levou a questão até a Câmara
Superior do Carf - última instância. Mas acabou perdendo por voto de
qualidade, proferido pelo presidente do colegiado, que é representante da
Fazenda Nacional.
Resolveu, então, se aproveitar dos benefícios da Lei 14.689, que prevê o
cancelamento de multas e juros de mora se o montante devido for quitado em
até 90 dias. Pagou o principal, que era de cerca de R$ 4 milhões. Porém, foi
negado o abatimento de multas e juros, segundo explica o advogado Bruno
Fajersztajn, CEO do Mariz de Oliveira e Siqueira Campos Advogados, que
defende a empresa na Justiça.
O entendimento da Receita Federal é de que os benefícios não valem para
“existência de direito creditório do contribuinte”. A exceção está no inciso V
do artigo 3º da Instrução Normativa RFB nº 2205 e no Parecer SEI nº 943, da
Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), ambos de 2024.
Para o contribuinte, porém, a previsão seria ilegal, por não haver essa restrição
na lei, o que contraria os princípios da legalidade administrativa e da legalidade
tributária, além de criar distinção indevida entre contribuintes em razão da
origem do débito discutido em processo administrativo.
A União, por sua vez, representada pela PGFN, argumentou que o voto de
qualidade só foi necessário em relação a uma das questões discutidas no
processo, o limite de 30% para compensação da base negativa da CSLL. O
órgão também sustentou que tem o direito de cobrar multas e juros porque a
questão suscitada é decorrente de compensação não homologada.
Na decisão, porém, a juíza Noemi Martins de Oliveira, da 14ª Vara Cível Federal
de São Paulo, deu razão ao contribuinte. Ela apenas analisou a probabilidade
do direito e a urgência de julgamento, mas entendeu, em caráter provisório, que
a instrução normativa “cria limitação não prevista em lei, extrapolando os
limites do poder regulamentar e inovando indevidamente no ordenamento
jurídico, em afronta ao princípio da legalidade”.
Assim, a juíza ordenou que a União abstenha-se de cobrar os débitos de CSLL
exigidos em processo administrativo, “de modo que tais débitos não impeçam
a renovação da certidão de regularidade fiscal da empresa, não acarretem sua
inclusão no Cadin ou em outro cadastro de proteção ao crédito e, ainda, não
sejam protestados” (processo nº 5009254-46.2025.4.03.6100).
Segundo Fajersztajn, apesar de ainda ser liminar, a decisão aponta para a direção
correta ao interpretar que a Receita não poderia ter extrapolado o conteúdo da
lei para limitar o benefício de cancelamento de multas e juros. “Na própria lei
não há uma distinção, então o benefício deveria valer tanto para as
compensações quanto para os autos de infração. É uma decisão inédita, correta,
que ajuda a afastar uma ilegalidade do entendimento da Receita e da PGFN”,
diz.
Artur Muxfeldt, sócio do BVZ Advogados, destaca que o tema ainda é recente
no Judiciário. Ele cita um outro precedente favorável aos contribuintes no
Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), que não abordava o mesmo
ponto, mas também questionava a instrução da Receita e o parecer da PGFN.
No caso, os benefícios foram negados porque o voto de qualidade apenas
rejeitou a decadência da cobrança. A 3ª Turma Especializada, por unanimidade,
porém, negou o recurso da União, assentando que a lei não fez “qualquer
limitação quanto ao objeto ou matéria do processo administrativo fiscal”
(processo nº 5075609-89.2024.4.02.5101).
No ano de 2024, até outubro, 3,7% dos processos do Carf tinham sido
resolvidos por voto de qualidade, o que representou um aumento em relação a
2023, quando só 2,9% dos processos foram finalizados por essa modalidade.
Procuradas, tanto a PGFN quanto a Receita Federal afirmaram que não se
manifestarão a respeito da decisão judicial.